OS LIMITES DA INCOMPETÊNCIA

 

Ubiratan Iorio

 

(artigo de 30/7 no Jornal do Brasil)

 

    

          

Após dez meses de indecisões, de dois desastres de proporções gigantescas, de declarações desencontradas dos responsáveis pela quase dezena de órgãos existentes hoje em nossa aviação civil, de deboches dos fantoches do Planalto ocupantes de cargos de ministros, de desconsideração das empresas aéreas para com os passageiros, de insubordinações de controladores de vôos, enfim, depois de quase um ano de demonstrações quase que diárias de incompetência por parte do governo federal, o que podemos esperar?

 

Até quando a inépcia de um governo formado por pessoas despreparadas e por indicações meramente políticas de quem não entende do assunto e não sabe tomar decisões vai continuar ceifando vidas inocentes? E até que ponto de desespero o despreparo oficial vai manter sob estado de permanente tensão os milhões de passageiros das aeronaves que cruzam quando decolam - nossos céus que deixaram de ser de brigadeiro?

 

Anac, Infraero, DCEA, Cindacta, Ministério da Defesa, Comando da Aeronáutica, CONAC... A sopa de letras e siglas soa inexaurível, como sem fim é o sofrimento dos familiares das vítimas dos dois acidentes e inesgotável o dos usuários de nossos aeroportos com essa intolerável situação! Com tantas letras, afinal, quem controla o que e quem manda em quem? A impressão que se tem é que ninguém comanda ninguém, cada responsável pelos diversos órgãos diz o que lhe vem à telha e isto quando se digna de dizer alguma coisa e que, pelo andar da carruagem, o caos, tantas vezes negado quanto tantas confirmado pelos fatos, não tem data marcada para terminar. Para este governo, incompetência parece não ter limites.

 

O que pensar de um governo que, na mesma semana em que duzentas pessoas perderam tragicamente suas vidas, ousou condecorar com uma medalha por bons serviços prestados à aviação brasileira o presidente da Anac, um engenheiro especializado em turismo, colocado no cargo por ser politicamente ligado ao PT, que não pode ser demitido e que só pode largar o posto caso um ressaibo de remorso o faça a ele renunciar? De um governo cuja ministra do Turismo, há cerca de um mês, sugeriu aos passageiros que adotassem atitudes que alguém do primeiro escalão não pode sugerir? De um mesmo governo cujo mentor de nossa política externa terceiro-mundista, na companhia de um assessor, comemorou a notícia de que o avião da TAM estaria com um defeito com gestos obscenos? O que diriam disso os pioneiros de nossa aviação comercial, os fundadores da Varig, da Transbrasil e o comandante Rolim, da própria TAM, por exemplo, caso ainda vivessem? Certamente, devolveriam as próprias medalhas.

 

Este pandemônio não pode continuar sendo tolerado pelos brasileiros. O mercado de aviação civil no Brasil está mais concentrado que há alguns anos atrás: a rigor, está nas mãos de duas empresas e a solução seria abri-lo à competição com as companhias estrangeiras, o que geraria ganhos para os consumidores, tanto em termos de tarifas mais baixas quanto de liberdade de escolha.  Os aeroportos que são um bom negócio em termos econômicos  permanecem nas mãos do Estado, quando urge que sejam privatizados mediante concessões, tal como ocorreu com algumas rodovias. Os órgãos que compõem a sopa de letras estão inflados de companheiros que entendem tanto de aviação quanto um cupim de mecânica quântica. Alguns devem, simplesmente, ser extintos; outros necessitam passar por um processo severo de despolitização e fusão, passando a obedecer a um só comando, subordinado à Aeronáutica e formado por pessoal técnico oriundo da Força Aérea e das próprias empresas do setor.    

 

Parece evidente que a troca do ministro da Defesa, embora tardia, não será suficiente para acabar com a crise, porque aviação não é a área do novo ministro e porque seu nome representa, apenas, mais uma dentre tantas escolhas políticas, em detrimento de uma decisão técnica. Talvez o presidente, quem sabe, o tenha escolhido por ter sobrenome de aeroporto internacional?

 

 

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